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domingo, 26 de junho de 2011

O homem com uma coroa de dedos



Ou você transforma sua energia em algo criativo ou ela irá tornar-se ácida e destrutiva. Energia é uma coisa perigosa - se você a tiver, tem que usá-la de forma criativa, caso contrário, mais cedo ou mais tarde irá perceber que ela se tornou destrutiva. Então encontre algo, o que você preferir, em que seja possível pôr sua energia. Se quiser, pinte. Se preferir, dance ou cante, ou então toque um instrumento. Seja o que for que você queira, encontre uma forma através da qual você consiga se soltar completamente.

Se você conseguir se soltar tocando violão, bom! Nestes momentos em que estiver solto, sua energia será liberada de forma criativa. Se você não conseguir se soltar através da pintura, da dança, de um violão ou de uma flauta, então encontrará formas mais baixas de se soltar: ira, raiva, agressão. Estas são formas rasteiras de se soltar.

Gautama Buda iniciou um assassino no sannyas – e esse não era um assassino comum. Hudolf Hess não é nada comparado a ele. Seu nome era Angulimal. Angulimal significa o homem que usa uma coroa de dedos humanos. Ele havia feito um voto de que mataria mil pessoas. De cada pessoa que matasse, pegaria um dedo para que lembrasse quantos já havia matado, e ele faria uma coroa com todos esses dedos.

Em sua coroa, já tinha 999 dedos, faltava apenas mais um. E lhe faltava esse último dedo porque a estrada em que se encontrava estava fechada para que ninguém passasse por lá. Mas o Buda Gautama tomou a estrada fechada. O rei havia posto guardas para que ninguém seguisse esse caminho, sobretudo estrangeiros que não sabiam que havia um homem perigoso morando do outro lado das colinas. Os guardas avisaram ao Buda que ele não deveria passar por aquela estrada, pois era o local onde Angulimal vivia, e nem mesmo o rei tinha coragem de se aventurar por aquela estrada, pois o homem era completamente louco.

Disseram a Buda que a mãe de Angulimal costumava ir vê-lo. Ela era a única pessoa que ia vê-lo de vez em quando, mas até mesmo ela havia deixado de ir. Da última vez que ela tinha ido lá, ele disse a ela: “Agora preciso de apenas um último dedo, e só porque você é minha mãe... Desejo avisá-la que, se você voltar mais uma vez, não irá retornar. Preciso desesperadamente desse último dedo. Até agora não matei você porque havia outras pessoas à disposição, mas agora ninguém mais passa por essa estrada a não ser você. Então quero avisá-la de que, se vier mais uma vez, você será responsável, e não eu.” E desde então a mãe não havia voltado. Os guardas disseram a Buda que ele não deveria correr esse risco desnecessário.

E o que Buda respondeu a eles? Buda disse: “Se eu não for, quem irá? Só há duas opções possíveis: ou serei capaz de transformá-lo – e não posso deixar passar esse desafio – ou então darei a ele o último dedo que deseja, de forma que seu desejo seja satisfeito. Dar minha cabeça a Angulimal pelo menos terá alguma utilidade. Do contrário, algum dia irei morrer e vocês me colocarão na pira funerária. Creio que é melhor realizar o desejo de alguém e dar a ele paz interior. Então ele me matará ou eu o matarei, mas esse encontro precisa acontecer: levem-me até lá.”

As pessoas que costumavam seguir o Buda Gautama, seus companheiros mais próximos, que em geral competiam para ficar mais perto dele, começaram a diminuir o passo. Logo havia algumas milhas entre Buda e seus discípulos. Todos queriam ver o que iria acontecer, mas não queriam chegar muito perto. Angulimal estava sentado numa pedra observando. Ele não podia acreditar no que via. Um belo homem com enorme carisma estava vindo em sua direção. Quem poderia ser esse homem?

Ele nunca ouvira falar no Buda, mas mesmo o coração duro de Angulimal começou a sentir uma certa ternura por ele. Era tão bonito, e estava vindo em sua direção. Era de manhã cedo, havia uma leve brisa, o sol estava se levantando... Pássaros cantavam e as colinas estavam floridas. Buda ia se aproximando. Finalmente, Angulimal, segurando a espada em suas mãos, disse: “Pare!” Buda estava apenas a alguns metros, e Angulimal disse: “Não dê nem mais um passo, do contrário não me responsabilizarei por meus atos. Talvez você não saiba quem sou!”

Buda disse: “Você sabe quem você é?” Angulimal disse: “Não é isso que está em questão. E esse não é o local nem a hora para discutir esse tipo de coisas. Sua vida está em perigo!”
Buda disse: “Eu penso de outra forma – a sua vida está em perigo.”
O homem disse: “Costumava pensar que eu era maluco, mas na verdade o maluco é você. E você continua se aproximando. Então não diga que matei um homem inocente. Você parece tão inocente e belo que gostaria que você voltasse. Encontrarei outra pessoa. Posso esperar, não há pressa. Se já lidei com 999, é apenas uma questão de tempo até encontrar mais um, mas não me force a matá-lo.

Buda chegou muito perto, e as mãos de Angulimal tremiam. Ele era tão belo, tão inocente, parecia uma criança. Ele já estava apaixonado. Tinha matado tantas pessoas e nunca sentira essa fraqueza. Nunca havia compreendido o que era o amor. Pela primeira vez estava cheio de amor. Assim havia uma contradição: a mão segurava a espada para matar a pessoa, mas o coração dizia: “Ponha a espada de volta na bainha.”

Buda disse: “Estou pronto, mas porque sua mão está tremendo? Você é um grande guerreiro, até o rei tem medo de você, e sou um pobre mendicante. Exceto pela tigela de esmolas, eu nada tenho. Você pode me matar e ficarei imensamente satisfeito que pelo menos minha morte irá realizar os desejos de alguém. Minha vida terá sido útil, minha morte também terá sido útil. Mas, antes que você corte minha cabeça, tenho um pequeno desejo e acho que você me concederá esse desejo antes de me matar.”

Perante a morte, mesmo o mais duro inimigo está disposto a conceder um último desejo. Angulimal disse então: “O que você quer?”
Buda disse: “Quero que você corte da árvore um galho que esteja cheio de flores. Nunca mais verei estas flores, então quero vê-las bem de perto, sentir seu perfume e sua beleza nesse sol da manhã, em toda sua glória.”

Então Angulimal cortou com a espada um galho inteiro cheio de flores. Antes que pudesse entregá-lo, Buda disse: “Isso era apenas metade do desejo. A outra metade é, por favor, coloque o galho de volta na árvore.”

Angulimal disse: “Desde o início achei que você era maluco. Este é o desejo mais louco que já ouvi. Como posso colocar esse galho de volta?”

Buda disse: “Se você não pode criar, não tem o direito de destruir. Se não pode dar vida, não tem o direito de tirá-la.”

Houve um momento de silêncio e transformação... A espada caiu de suas mãos. Angulimal se jogou aos pés do Buda Gautama e disse: “Não sei quem você é, mas seja quem for, leve-me para o mesmo espaço em que você está. Me inicie.”

A essa altura os seguidores de Buda já haviam chegado cada vez mais perto. Estavam à sua volta e, quando ele se jogou aos pés de Buda, se aproximaram imediatamente. Alguém disse: “Não inicie esse homem, ele é um assassino!”

Buda disse mais uma vez: “se eu não o iniciar, quem o fará? E eu amo esse homem. Amo sua coragem. E posso ver uma enorme potencialidade nele: um único homem lutando contra o mundo inteiro. É esse tipo de pessoa que procuro, alguém que possa se levantar contra o mundo. Até agora ele enfrentou o mundo com uma espada, agora irá enfrentar o mundo com uma consciência, o que é muito mais afiado que qualquer espada. Eu disse a vocês que um assassinato iria ocorrer, mas não estava claro quem seria assassinado – eu ou Angulimal. Agora vocês podem ver que Angulimal foi assassinado. E quem sou eu para julgar?”

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