O sacrifício de animais por parte dos cultos afro-brasileiros sempre foi motivo de discussão entre sacerdotes e entidades protetoras dos animais.
Pessoalmente, sou contra qualquer coisa que provoque sofrimento em um animal inocente, como o que fazem com os animais de rodeio, como as mutilações que fazem em animais de estimação, onde veterinários extirpam cordas vocais, mudam características físicas, só para que os seus donos sejam mais felizes com o seu “brinquedinho” de estimação. Sou contra, também, a utilização de animais como escravos, para qualquer tipo de trabalho, como os cavalos que puxam carroças e são, literalmente, espancados para que andem mais rápido e possam render alguns trocados aos seus donos.
É preciso, também, dizer aos amantes dos animais, que o sacrifício animal é somente uma pequena parte de um contexto muito maior que envolve o ebó (sacrifício ou oferenda). Algumas oferendas podem incluir, ainda, velas, frutas, doces ou qualquer coisa que possa ser apreciada pela divindade.
Durante o jogo de búzios o orixá pode pedir qualquer coisa, como sua fruta favorita, ou pode pedir que a pessoa atenda a um conselho, ou, ainda, que a pessoa abandone o álcool, ou outra ação que a prejudique. Pode pedir que use certas jóias, ou determinada roupa, ou que realize sua iniciação, ou que faça inúmeras outras coisas. Eles podem pedir, também, que se realize um sacrifício animal, para que o orixá possa ajudar a pessoa.
Normalmente, o sacrifício animal só é pedido quando a pessoa em questão está passando por um grande perigo, ou, então, quando o filho-de-santo é consagrado ao seu orixá, ou faz os assentamentos dos orixás que farão parte da sua obrigação.
Evidentemente, o sacrifício é visto com reserva por muitas pessoas e os cultos afro-brasileiros são vistos, por isso, como um culto primitivo.
Isso acontece porque a sociedade moderna sempre procurou nos separar do conceito da morte. Por isso, nossos próprios mortos são embalsamados para parecerem que estão vivos. Inúmeros artifícios são utilizados para desviar nossa atenção para o fenômeno da morte.
Quando compramos carne, ou até mesmo um sapato de couro, nos esquecemos que um animal teve que ser morto para que tívessemos a carne e o sapato para calçar.
Quando os animais são mortos nos frigoríficos e matadouros, a única coisa que importa é que eles sejam mortos em grande quantidade para atender a um mercado que exige, a cada dia, uma grande demanda de carne. Em vista disso, os animais são tratados com muito desrespeito. Esses animais também são sacrificados, entretanto, o orixá cultuado aqui é a cobiça. Se alguém já teve a oportunidade de visitar um aviário, ou um frigorífico sabe muito bem do que eu estou falando. Além disso, é importante lembrar que os aviários industriais de hoje matam mais galinhas em um dia do que a religião sacrificou em cem anos.
Quando um animal é sacrificado para um orixá, ele é tratado com respeito. Respeito para com o animal e respeito para com o orixá. Quando o animal é apresentado ao orixá, cantamos uma reza apropriada ao sacrifício, em reconhecimento ao orixá e também ao animal. Existe um grande respeito pela vida, e também pela morte.
Depois do sacrifício, se o animal não foi utilizado em um eru (cerimônia de troca de vida), ele é preparado e serve para a alimentação de todos os participantes.
O princípio básico no sacrifício é o oferecimento da força vital aos antepassados ou Orixás, e sempre buscamos a morte do animal de forma rápida, limpa e evitando, desta maneira, o sofrimento desnecessário do animal.
Existe, no entanto, um ponto a ser destacado, que são os atos de barbarismo que são praticados em rituais de sacrifício animais. Conheço casos em que os sacrifícios se parecem com verdadeiras sessões de martírio e tortura, ao se provocar, propositalmente, intenso sofrimento aos animais antes de matá-los.
A sangue frio sacerdotes arrancam pêlo e penas, arrancam os olhos, testículos ou quebram seus ossos, antes de sacrificá-los. Estes atos são criminosos e não um ato litúrgico sagrado, com um profundo sentido místico ou religioso.
São muitos os sacerdotes que praticam aquilo que se chama de “apresentação da carne”, que consiste em esquartejar os animais sacrificados enquanto entoam cantos dedicados aos orixás, como se estes ficassem felizes em ver este ato dantesco de sangue e de morte.
Este tipo de representação absurda e mórbida, de uma complexidade ritualística inventada por dementes, rompe com a pureza e com os princípios que regem o verdadeiro culto aos orixás e com os atos mais sagrados da nossa tradição religiosa, seja ela de Candomblé, Batuque, Umbanda ou Quimbanda.
Não existe nenhum sentido ético, e muito menos sagrado, em arrancar pedaços de carne de animais sacrificados para logo dançar e cantar ao redor deles, como faziam antigamente os bárbaros e outras etnias semi-selvagens, com as cabeças cortadas de seus inimigos.
A religião afro-brasileira tradicional trata com muito respeito o ato do sacrifício. Ele é executado com grande seriedade e respeito, porque a presença da morte imprime grande transcendência ao sacrifício. Os animais são sacrificados com rapidez e precisão para que, ao ser derramado seu sangue ele possa chegar com suavidade aos “fundamentos dos Orixás”. Depois disso, eles são limpos para que sua carne seja consumida pelos devotos e algumas vísceras são preparadas para serem oferecidas, também, aos Orixás.
Portanto, quando alguém conhecer algum caso de barbarismo nos sacrifícios, saiba que isto não é um culto afro-brasileiro de verdade, senão um maníaco que está cometendo um crime. Este é um caso de polícia, e como tal deve ser tratado: Por favor, denuncie-o na delegacia de polícia mais próxima, pois ele não passa de um criminoso, e nunca será considerado um sacerdote.
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